A divulgação das atas do FOMC (Comitê Federal de Mercado Aberto) referentes à reunião de 17 e 18 de dezembro trouxe um tom que deveria tranquilizar o mercado, mas o efeito acabou sendo o oposto. Em vez de fornecer clareza sobre os próximos passos do Federal Reserve, o documento revelou um Fed mais incerto e enigmático, refletindo preocupações com os impactos de mudanças políticas e econômicas que ainda não estão totalmente precificadas.
O corte de 25 pontos-base na última reunião de 2024 já era amplamente esperado. Porém, o que mais chama a atenção nas atas é a abordagem cuidadosa dos formuladores de políticas. A mensagem nas entrelinhas? O Fed não tem todas as respostas — pelo menos, não ainda.
O documento destaca que alguns membros do Fed estão preocupados com os efeitos das políticas comerciais e de imigração do presidente eleito Donald Trump sobre a inflação. Essas possíveis mudanças adicionam um fator de incerteza que dificulta a leitura dos dados econômicos.
Além disso, os participantes apontaram que:
Essas projeções indicam um cenário complexo. Enquanto o Fed está tentando se mover em direção a uma política monetária mais neutra, as incertezas externas estão forçando o banco central a adotar uma abordagem mais cautelosa.
O que fica claro nas atas é que o Fed está atento, mas preocupado. A economia está se mantendo sólida por enquanto, mas os riscos — especialmente aqueles ligados a políticas de governo — não podem ser ignorados.
O corte de 25 bps na reunião de dezembro foi decidido por 11 votos a favor e 1 contra. Beth Hammack, do Fed de Cleveland, foi a única a votar contra a redução, argumentando que a política monetária já estava próxima do equilíbrio neutro.
O que isso sinaliza? Que talvez o Fed já tenha feito o suficiente. Mas, como o próprio Jerome Powell destacou em sua coletiva pós-reunião, a redução no ritmo dos cortes reflete a expectativa de inflação mais alta no futuro. Isso deixa claro que o Fed não está confortável com uma flexibilização acelerada.
O resumo das projeções econômicas (SEP) reforça isso. O gráfico de pontos atualizado indica que o Fed prevê dois cortes de 25 bps em 2025, uma redução significativa em comparação com os quatro cortes projetados anteriormente.
Powell foi direto ao dizer que o foco continua sendo a inflação. No entanto, ele também deixou claro que o Fed está disposto a desacelerar o ritmo de cortes caso os dados econômicos apontem para a necessidade de maior cautela.
As atas deixam evidente que o maior risco hoje vem das políticas externas ao próprio Fed. O presidente eleito Donald Trump pretende adotar medidas que podem afetar diretamente os preços — especialmente tarifas comerciais e mudanças nas regras de imigração.
Esses fatores criam um cenário de incerteza que está influenciando as decisões do banco central. Como os formuladores de políticas podem prever o impacto de tarifas que ainda nem foram implementadas? Como podem projetar a inflação se políticas de imigração podem mudar o cenário do mercado de trabalho?
Essas são perguntas que as atas não respondem. E isso é um reflexo claro de que o Fed está tentando prever o imprevisível.
O mercado já está precificando 90% de chance de que o Fed mantenha as taxas inalteradas na próxima reunião de janeiro. Isso mostra que os investidores já esperam que o banco central adote uma postura de espera, analisando os dados antes de tomar novas decisões.
Porém, o grande teste para o mercado virá com o relatório de empregos de dezembro, que será divulgado na sexta-feira. Se os números forem positivos, o Fed pode se sentir confortável em manter a política estável. Caso contrário, as discussões sobre novos cortes podem ganhar força.
As atas do FOMC mostram um Fed que, apesar de seu tom confiante, está cheio de dúvidas sobre o futuro. E, sinceramente, quem pode culpá-los? O cenário econômico global está em constante mudança, e as políticas do governo dos EUA adicionam ainda mais complexidade a essa equação.
Para os investidores, o recado é claro: não espere grandes movimentos do Fed nos próximos meses. O banco central está adotando uma postura cautelosa e vai reagir de acordo com os dados que receber. No entanto, a falta de previsibilidade pode continuar a trazer volatilidade ao mercado.
Em um cenário onde o Fed parece cada vez mais misterioso, o segredo para os investidores será ler nas entrelinhas — não apenas o que o banco central diz, mas também o que ele evita dizer. Afinal, o verdadeiro mistério está nas omissões.
Por enquanto, a postura do Fed é de observação, mas os riscos permanecem elevados. E quanto mais incerta for a política do governo, mais complicada será a atuação do banco central.
O Fed pode estar cauteloso, mas uma coisa é certa: as perguntas que ele ainda não respondeu continuarão assombrando o mercado nos próximos meses.